Participo mensalmente do Clube de Leitura do Grupo Mulheres do Brasil, onde é feita uma curadoria e a cada mês exploramos o tema de um livro. Neste mês estudamos o livro da Clarice Lispector, publicado em 1969, “Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres”, seu sexto romance.
O livro acompanha o relacionamento amoroso entre Loreley (Lóri), uma professora primária, e Ulisses, um professor de filosofia. A tensão entre os dois, que têm objetivos e desejos diferentes, leva a um processo de aprendizagem e de autodescoberta incríveis de ambos.
Trago algumas frases pinceladas do livro que fazem sentido com a análise que faço logo abaixo:
A necessidade que deve estar mais presente no ser humano que é tornar-se humano;
Por medo ela não encarou a dor e sofria o tempo todo;
Lóri fugia da realidade o tempo todo;
Como ela não estava inteira não usufruía do seu nome inteiro (Loreley) e sim do apelido (Lóri);
Se boicotava, em um trecho do livro ela diz: “Tenho sido a maior dificuldade no meu caminho, com esforço me sobreponho a mim mesma”;
Antes de se entregar de corpo e alma para Ulisses precisava tocar a si mesma, tocar o mundo, antes de tocar outra alma;
Angústia era uma forma de sentir a dor;
Não quero ser feliz, prefiro a mediocridade;
Queria que lhe dessem tudo, mas ela sabia que não dariam, que ela teria que procurar;
A máscara a incomodava, mas era o único jeito dela sobreviver na sociedade;
O óbvio é a verdade mais difícil de se enxergar;
A tragédia de viver existe, mas não impede que tenhamos uma profunda aproximação da alegria com essa mesma vida;
Quem é capaz de sofrer é capaz de intensa alegria;
Por mais liberal que Ulisses se demonstrasse, em alguns trechos do livro percebe-se o machismo impregnado, muito pela cultura, pela sua criação;
Em outro trecho do livro Ulisses diz a seguinte frase para Lóri: “Você é uma mulher muito antiga, é raro encontrar uma mulher que não rompeu com a linhagem de mulheres através do tempo”, ou seja, ela não conseguia romper as correntes do passado e viver a sua vida do presente, vislumbrando o futuro;
Ela aprendeu que no dia ou podemos sofrer ou ter prazer com ele;
Em estado de graça se era muito feliz;
Traz o pai como responsável do modo de ela ser, foi protegida demais e isso impactou diretamente na sua vida adulta;
Ela conseguiu se libertar das correntes da sociedade e isso ninguém perdoa.
Algumas interpretações sobre os personagens e temas abordados no livro:
Ulisses é um farol, mostra o caminho, é um mentor na vida de Lóri. Ele ensina, mas provoca, é realmente um educador, tenta sempre extrair o melhor dela;
O sucesso do mentor é o crescimento do seu mentorado e uma das principais trocas é o aprendizado que temos com eles;
Lóri está em busca do autoconhecimento e de se encontrar, em busca do prazer;
Lóri é a nossa psique, é o que está mais fundo no nosso inconsciente e que muitas vezes preferimos deixar ela quietinha para não trazer a tona algumas dores, algumas frustrações que podem desestruturar a vida que achamos que é perfeita, mas na verdade é só um fingimento e não a realidade;
Quando ela consegue lidar com a vida e com a morte ela se encontra;
Lóri se transveste (máscara) para chocar, assumimos personas que não mostram quem realmente somos, nos esconde e isso faz com que ela consiga viver na sociedade, não se encontrando com a sua verdadeira essência;
Se vitimiza muito pela história de vida com o pai;
Enquanto ela não se amar, ela não se entrega a si mesma;
Tem um trecho do livro que ela mergulha no mar e esse mergulho faz com que ela se reconecte com a sua essência, ela se purifica e ela começa a sentir e isso ocorre porque a água é o elemento das emoções, da vida, do nascimento;
A importância da solidão para se encontrar, precisamos do silêncio para nos reconectarmos com o nosso eu;
Se desapegar para não fazer doença, sair do papel de mulher maravilha, de perfeita, de desagradar aos outros, essas ações nos adoecem e nos fazem involuir ao invés de evoluir;
Extraordinárias são as pequenas ações da vida (acordar, ver o sol, contemplar a natureza, sorrir, chorar de alegria, dormir);
Dizer “sim” para todas as coisas da vida, boas ou ruins, pois as ruins nos ensinam, nos amadurecem, nos transformam;
Sempre buscar o autoconhecimento e conhecimento da vida;
O movimento da vida nos exige uma escuta fina, genuína;
Para "ser" eu preciso abraçar todas as faces do humano;
Muitas vezes não temos força para suportar a liberdade, temos que ter consciência das escolhas;
O cuidado de si implica no outro;
Em um dos trechos do livro, no final, Lóri traz a seguinte reflexão: “Se eu fosse eu…?”. Ser você mesmo incomoda, então é mais fácil fingir, mas sabemos que uma ilusão, porque a vida nos cobra ser nos mesmos em algum momento da vida;
Temos medo de ser grande o suficiente e de ser melhor ou mais evoluído que os outros, pois gera desconforto;
O livro de Clarice tem muitos finais e inícios de parágrafos que não se concluem, pois terminam com vírgula, reticências ou dois pontos e a leitura que podemos fazer é que ela quer nos mostrar que a vida é um contínuo e está sempre em transformação.
Em síntese, além das belíssimas reflexões que o livro nos traz, ele não é uma leitura fácil de início, mas no momento em que você se entrega a mesma e vai mergulhando na história dos personagens é apaixonante e não para de ler até descobrir o desfecho da trama.
Reflita por um minuto: quantas coisas você precisa ter coragem para deixar morrer? Padrões que não lhe servem mais, comportamentos, sentimentos, histórias... Por apego, muitas vezes continuamos repetindo situações e atitudes que nos causam dor, mesmo sabendo que elas não fazem mais parte da nossa história. Nesses momentos, é preciso ter a determinação de romper. Você já tem o poder de reaprender pelo amor e não mais pela dor. Permita-se viver nessa nova vibração. O renascer com o amor vai lhe conectar com essa capacidade. Para poder renascer é necessário ter coragem para deixar ir embora o que não lhe serve mais.
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